quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Contribuições teóricas para o Estudo de Organizações Internacionais

HERZ, Mônica; HOFFMANN, Andrea Ribeiro. Organizações internacionais: história e práticas. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.

Capítulo 2 – Contribuições teóricas para o Estudo de Organizações Internacionais

As diversas teorias das Relações internacionais contribuem para o entendimento das Organizações Internacionais. Parte dos estudos de relações internacionais é focado no papel, origem, dinâmicas e formato das instituições, bem com no seu impacto no comportamento dos Estados.
No contexto de nascimento da disciplina de relações internacionais, no primeiro debate entre liberais e realistas, o balanço de poder, o direito internacional e as organizações internacionais são vistos como formas de gerar ordem no sistema internacional. A literatura nesse período abordava as diferentes propostas ao longo da história do modelo de sistema de Estados que evitariam as guerras. Os trabalhos de Carr e Morgenthau estabeleceram as bases do pensamento realista da disciplina.
No final da Segunda Guerra Mundial a criação do sistema ONU trouxe otimismo, embora o realismo não dê maior relevância às organizações internacionais. Os trabalhos dão ênfase na estrutura, procedimentos e padrões de votação das OIGs.
Na década de 1960 se separou o estudo dos mecanismos de estabilização internacional e a atuação das organizações internacionais. Vários estudos foram feito sobre o que as OIGs poderiam fazer nas áreas de paz e segurança, descolonização e ajuda ao desenvolvimento. Nos anos 70 houve a discussão sobre a relação entre as características do sistema internacional e o papel das organizações internacionais. As críticas ao realismo favoreceram os estudos de outros atores como as OIGs e ONGIs.
Entre os anos 1950 e 1970 desenvolveram-se as teorias de integração fruto da visão de que nem as organizações internacionais nem os Estados nacionais dariam conta dos problemas internacionais, sendo proposto o conceito de integração regional. A partir dos anos 80 os estudos de regimes internacionais dominavam os estudos sobre instituições internacionais, esses estudos tratavam do processo de formação dos princípios, normas regras e procedimentos, que compõe diferentes regimes e seu impacto no comportamento dos atores. A escola inglesa desenvolveu a idéia de sociedade internacional na qual a ordem internacional é analisada a partir de normas e valores.
Nos anos 90, o tema das organizações ganha espaço a na literatura e no currículo dos cursos universitários em função do otimismo do papel das organizações internacionais no pós-guerra fria. Como crescimento do papel das organizações internacionais cresce também a bibliografia sobre o tema.

Realismo
Para os realistas os Estados são os principais atores das relações internacionais. Os Estados são entendidos como atores unitários, que buscam maximizar seu poder e sua segurança. O sistema internacional é visto como anárquico, no qual, os Estados buscam maximizar seu poder. A cooperação no sistema internacional é dificultada pela insegurança do sistema. As OIGS, nesse contexto, não têm poder nem autoridade supranacional, os Estados seguem suas normas de acordo como seus interesses. As organizações são vistas como instrumentos para os Estados mais poderosos atingir seus objetivos. Os realistas são céticos ao papel das organizações internacionais e críticos aos trabalhos de teóricos de outras correntes.

Liberalismo
A visão liberal das organizações internacionais inclui uma ampla gama de proposições. A idéia de que a intensificação do comercio internacional favorece a paz na relações entre os Estados e de que as instituições internacionais possam transformar os atores para construir esse processo.

Fundamentalismo
O funcionalismo está fortemente relacionado ao trabalho de David Mitrany que propõe que uma rede de organizações internacionais possa evitar a guerra, assim, estabelece conexão entre cooperação internacional e segurança internacional. Propõe que a cooperação seja iniciada nas áreas técnicas. As sociedades são cada vez mais interdependentes em razão dos avanços da tecnologia.
Mitrany propõe um sistema de paz a partir de uma maior cooperação internacional. Com o crescimento do fluxo de bens e comunicação há necessidade de coordenar as ações dos Estados. No entanto, isso não representa uma ameaça frontal a soberania. Na cooperação a soberania não seria superada, mas compartilhada.
Os conflitos armados são associados a suas causas sociais que podem ser trabalhadas pelas organizações internacionais. Os agentes de cooperação podem transbordar sua atuação da esfera técnica para a política.

Neofuncionalismo
O neofuncionalismo foi a teoria a teoria de integração hegemônica que esteve presente nos anos 50 e 60 no processo de integração na Europa ocidental. Para o funcionalismo o processo gradual de integração em áreas específicas pode culminar na integração. A existência de órgãos supranacionais eleva o nível da integração. Ao contrário dos funcionalistas, os neofuncionalistas conferem papel central às relações regionais. No sistema regional se atingiu um consenso tal qual sistema doméstico.
As criticas aos neofuncionalistas parte dos realistas que vêem o Estado como preeminente. Nos anos 80, a teoria neofuncionalista foi revista uma vez que os Estados não estavam tendo papel claro na integração.

Marxismo
Os autores marxistas partem de uma visão da realidade social como uma totalidade. As relações entre os modos de produção, o trabalho assalariado e a propriedade privada são motores da história. Essas relações são reproduzidas nas organizações internacionais.
Na teoria imperialista de Lênin as instituições internacionais são arranjos possíveis para as potências imperialistas, que permitem administrar a competição entre elas. A partir da década de 1970 o marxismo passou a compor as teorias de relações internacionais. O conflito opera dentro e através dos Estados. A anarquia está associada ao modo de produção capitalista. A governanta global está associada a organização da economia que possibilita o capitalismo.
A teoria crítica é fortemente associada ao marxismo e surgiu na década de 1980. Sua análise parte de evidências empíricas e modelos abstratos. Para além das relações de classe é incorporada a análise das diferentes formas de exclusão e inclusão geradas por comunidades. A discussão da importância das elites na estruturação da economia política global é fortemente influenciada por Gramsi. O conceito de hegemonia é uma concepção tanto de coerção quanto de consenso. Os teóricos marxistas salientam o papel das organizações internacionais na reprodução do sistema capitalista. As organizações internacionais são vistas como arena de formação de coalizões entre as potências capitalistas, como produtoras de mecanismos de submissão de Estados na periferia do sistema e como espaço de formação de hegemonia e reprodução das relações de poder dominantes.

Perspectiva Cosmopolita
A perspectiva cosmopolita lida com dois temas universais: existência de valores universais e o déficit democrático. A democracia tem por base o Estado-nação embora haja estruturas internacionais. As organizações internacionais surgiram baseadas em princípios morais universais. A idéia de cidadania é anterior à formação dos Estados.
Kant introduz a idéia de comunidade universal e cidadania universal. Essa visão atinge a soberania interna e externa do Estado territorial. Kant acreditava que com o desenvolvimento da vida moral moral e sociedade civil universal transformaria as relações internacionais.
David Held resume em três elementos a perspectiva cosmopolita: o princípio do igualitarismo individualista, o princípio do reconhecimento recíproco e o tratamento imparcial perante práticas, regras ou instituições. A perspectiva cosmopolita é de forte caráter normativo e representa um bom caminho para as Organizações Internacionais.

Construtivismo
Os trabalhos construtivistas têm ênfase na formação de identidades e interesses e na desmistificação de conceitos da literatura de relações internacionais tais como anarquia e interesse nacional. Os construtivistas dão importância às praticas discursivas porque essas dão sentido ao mundo e estabelecem relações de poder.
A racionalidade dos atores e instituições no sistema internacional é guiado por normas. Para os construtivistas as organizações internacionais podem mudar interesses e identidades dos Estados e de outros atores. Como fórum as organizações internacionais geram espaço de interação que gera resultados, mudança nos interesses, nas identidades e na atribuição de racionalidade às práticas sociais.
Para Wendt o entendimento das instituições internacionais deve ser intersubjetivo. As organizações internacionais podem mudar o sistema internacional por serem arenas onde se produzem e ensinam normas. Onuf vê as regras como guia de comportamento que se forma a realidade por meio da linguagem. As estruturas são formadas por padrões de regras, instituições e conseqüências.

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Organizações Internacionais: definição e história

HERZ, Mônica; HOFFMANN, Andrea Ribeiro. Organizações Internacionais: definição e história. In ____. Organizações internacionais: história e práticas. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.

Definição de Organizações Internacionais
As organizações internacionais, tanto intergovernamentais como não-governamentais, são a forma mais institucionalizada de promover a cooperação internacional por terem caráter permanente. Nos meados do século XX o sistema político era visto como anárquico. Ao longo da história foram criados diversos mecanismos para estabilização da anarquia global.
O multilateralismo se apresenta como uma forma de institucionalização das relações internacionais. A prática do multilateramismo é norteada pela não discriminação, aplicação em todos os estados envolvidos e reciprocidade difusa. Há a tendência do multilateralismo em detrimento do bilateralismo para solução de problemas. As decisões dos atores internacionais são norteadas por regimes compostos de princípios, normas e procedimentos. As organizações internacionais são produto de regimes.
As Organizações Intergovermantais (OIGs) são produto da decisão dos Estados em especial as grandes potências e das potências médias. As OIGs são ao mesmo tempo atores centrais do sistema internacional, fóruns de circulação de idéias e produtoras mecanismos de cooperação entre atores. Além disso, contribuem para negociações por intermédio de sua máquina administrativa, que culminam em normas e regras.
A legitimidade das Organizações Internacionais está em produzir bens públicos. São fontes de poder das OIGs a legitimidades da autoridade racional-legal e o controle sobre conhecimento técnico e burocrático. O funcionamento das OIGs é caracterizado pela participação voluntária, corpo de representação ampla, princípio da igualdade de soberania e decisões baseadas em consenso. O processo decisório dentro das OIGs convive em conflito com o conceito de soberania.
As organizações não-governamentais internacionais são privadas e voluntárias, com membros individuais ou coletivos de diversos países. Essas organizações são voltadas para causas como meio ambiente, direitos humanos e paz.

O Funcionário Público Internacional
A noção de servidor público internacional, de caráter multinacional foi estabelecimento da Liga das Nações e foi se fortalecendo ao longo do século XX. Embora os funcionários públicos internacionais tenham vinculo profissional com a organização internacional o vinculo de cidadania permanece o que pode ocasionar tensões.

História das Organizações Internacionais
A maioria das organizações internacionais existentes foi criada na segunda metade do século XX. As organizações internacionais passaram a ter maior relevância na política internacional no século XX. As grandes conferências de Estados desde o século XVI buscam fixar normas que definem as relações internacionais modernas e foram precursoras das OIGs.
No século XIX com a industrialização, os avanços nos transportes e comércio aliado à expansão imperial surgiram diversos problemas que não podiam ser resolvidos no âmbito nacional. As diversas agências criadas no século XIX foram criadas para responder as necessidades de coordenação e cooperação em diversas áreas. O Concerto de Estados Europeus foi importante antecessor das modernas OIGs. Além disso, eram fóruns de grandes potências e tinha a idéia de que as grandes potências tinham responsabilidades e direitos especiais.
O sistema de Haia foi criado no contexto de duas conferências de paz em 1899 e 1907, representou uma mudança qualitativa em termos de universalização da administração do sistema internacional. Dava-se início ao desenvolvimento do direito internacional, codificação das leis e costumes quanto à condução da guerra para a melhor convivência internacional. As conferências de Haia tinham caráter racionalista e legalista.
A criação da liga das Nações foi fundamental para o desenvolvimento das futuras organizações internacionais, por que foi a primeira organização internacional universal voltada para a ordenação das relações internacionais, apesar de seu fracasso em conter a Grande Guerra. A Organização das Nações Unidas (ONU) foi crida marcada pela realidade do final da Segunda Guerra Mundial. A ONU representa o apogeu do processo de institucionalização dos mecanismos criados no século XIX. As organizações intergovernamentais regionais se proliferaram no final do século XX e buscam a identidade regional.
O final da Guerra Fria trouxe consigo o aumento do numero de países que compõe as OIGs, um maior ativismo da ONU e de suas agências, proliferação de estruturas informais. Por outro lado, as OIGs sofrem criticas devido a ineficiência e aos seus custos elevados.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Perspectivas da Organização das Nações Unidas (ONU) no século XXI

Perspectivas da Organização das Nações Unidas (ONU) no século XXI

Angélica Behenck Ceron


As organizações internacionais são vivas, sofrem transformações naturais ao longo do tempo em virtude de mudanças sociais. As organizações internacionais com o tempo passaram a tem novas atribuições em virtude de mudanças no cenário internacional. Todas as organizações internacionais criadas em um momento determinado tem sido obrigadas a adaptarem-se as novas situações e a ONU não tem sido uma exceção.
A Organização das Nações Unidas (ONU) é uma associação de Estados reunidos para com o propósito, segundo sua Carta, de: manter a paz e a segurança internacionais; desenvolver relações amistosas entre as nações, baseadas no respeito ao princípio de igualdade de direitos e autodeterminação dos povos; conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas internacionais de caráter econômico, social, cultural ou humanitário e para promover e estimular o respeito aos direitos humanos e as liberdades fundamentais para todos; e ser um centro destinado a harmonizar a ação das nações para consecução desses objetivos. A criação da ONU foi resultado da segunda guerra mundial e veio substituir o organismo análogo que, sob a denominação de “Liga das Nações”, funcionou em Genebra, depois da primeira guerra mundial.
A ONU foi fundada em 1945 com o propósito de criar um organismo multilateral que contribua para impedir a guerra, proteger a democracia e lutar contra a fome e a doença. Depois de mais de sessenta anos de existência as dificuldades de atingir esses objetivos ainda existem.
Segundo Kofi Annan (apud VALCÁRCEL, 2005, p. 151) as Nações Unidas constituem uma só organização universal responsável pela segurança, desenvolvimento e defesa dos direitos humanos em escala global. Estes três conceitos estão fundidos em um mesmo conceito. O que seria necessário para a ONU é corrigir seus erros, por meio de três aspectos: transparência da informação; atenção crítica aos resultados; e inovação constante de gestão. No momento, segundo Annam, é necessário promover o apoio: aos Estados; as instituições regionais, provinciais e locais; o setor privado; a sociedade civil, especialmente as ONG; e as instituições internacionais.
Muitos estudiosos vão além da visão apresentada por Annam. Há um movimento de transformação da organização a partir das necessidades da comunidade internacional, de mudanças culturais e da nova distribuição de poder no sistema internacional. As propostas de reforma da ONU têm por característica a multiplicidade de questões levantadas, dentre as quais tem destaque a preocupação com a democratização da organização. Outras questões debatidas são: problemas operacionais da organização, como por exemplo, o financiamento de projetos; a coordenação entre as unidades do sistema; cooperação com órgãos regionais; incentivo ao desenvolvimento; e sanções e recursos à ação militar. (VALCÁRCEL, 2005)
As propostas de reforma caracterizam-se pela multiplicidade de questões abordadas, dentre as quais se destaca a preocupação em democratizar a organização. Também é analisado os problemas operacionais da organização, particularmente o financiamento de projetos, a coordenação entre as unidades do sistema, as possibilidades de cooperação entre a ONU e as organizações regionais, o papel da ONU no incentivo ao desenvolvimento, o uso de sanções e o recurso à ação militar.
No que tange a democratização da ONU o debate tem se focado em duas questões centrais: o processo de decisão interna e a representação de atores não estatais, ou de caráter intergovernamental. Quando ao processo decisório interno vê-se a necessidade de equilíbrio entre Assembléia Geral e Conselho de Segurança; aplicação do Conselho de Segurança e mudança no sistema de veto; tornar mais clara a jurisdição do Conselho de Segurança e o papel da Corte Internacional de Justiça e a criação de uma terceira assembléia.
A crescente interdependência das sociedades internacionais gera tensão com os princípios de soberania e não-intervenção nos assuntos domésticos apregoados pela Carta da ONU. Surge assim, o debate sobre a intervenção legítima da comunidade internacional, por um lado, e a necessidade de gerar uma autoridade que elimine o caráter intergovernamental, por outro. Na cultura política internacional contemporânea o conceito de soberania estatal é questionado, sendo pensado novas possibilidades de intervenção da comunidade internacional.
As organizações internacionais são vivas e sofrem transformação ao longo do tempo devido a mudanças sociais e políticas. Desde sua criação, a ONU passou por mudanças, aumentou o número de membros e aumento na temática de sua agenda.
No que tange as questões de segurança, os mecanismos da ONU foram para conflitos entre Estados. Atualmente, porém, os conflitos são infra-estatais são mais freqüentes e geram crises mais dramáticas de caráter humanitário.
Os debates sobre a reforma da ONU, e em particular sobre as possibilidades de democratização da organização, em sua maioria buscam resolver problemas e são tímidos em sua dimensão emancipatória. A concentração da discussão em torno da congruência entre a distribuição de poder e a participação no processo decisório é expressão da continuidade da hegemonia do pensamento realista.
A necessidade de reformar o Conselho de Segurança vem sendo debatida desde o início da década de 1990, como conseqüência da maior relevância internacional da ONU no contexto pós-Guerra Fria e de sua autoridade enquanto órgão executivo da organização. As discussões têm como eixo as possibilidades de expansão do Conselho de, por um lado, e a modificação do sistema de votação, por outro. A reforma da ONU que inclua alteração na composição do Conselho de Segurança parece ser um empreendimento difícil. As alternativas de reforma apresentam inúmeros aspectos contraditórios, difíceis de serem superando. No entanto, sabe-se de que a atual composição do Conselho de Segurança não reflete o atual quadro de da ordem internacional.





REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


GRANELL, Francesc. Naciones Unidas: reforma y transformación. Política Exterior, Madrid, n. 108, p. 97-104, nov. /dic. 2005.

HERZ, Mônica. A internacionalização da Política: a perspectiva cosmopolita em face do debate sobre a democratização da ONU. Contexto Internacional, Rio de Janeiro, v. 21, n. 2, p. 259-289, jul./dez. 1999.

VALCÁRCEL, Darío; SÁNCHEZ-TERÁN, Gonzalo. La reforma de la ONU y los objetivos del milenio. Política Exterior, Madrid, n. 105, p. 145- 160, mayo-junio 2005.