FOULCAULT, Michael. Em defesa da Sociedade: curso no Collège de France (1975-1976). São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. 27-133.
Foucault mostra como os discursos sobre a guerra podem ser criados no contexto histórico. A partir do questionamento sobre a importância do modelo da guerra na analise das relações de poder, Foucault aponta duas formas de poder: o poder disciplinar, que se impõe ao corpo por meio das técnicas de vigilância e das instituições punitivas, e o denominado “biopoder”, que se exerce sobre a população, a vida e os vivos.
Foulcault se propõe a estudar o poder fora do modelo do Levitã, fora do campo delimitado pela soberania jurídica e pela instituição do Estado. O poder é analisado a partir das técnicas e práticas da dominação. Tendo em vista que o direito e o campo jurídico são o veículo de dominação, deve-se analisá-los sob o aspecto dos procedimentos de sujeição que ele põe em prática. Dessa forma, analisa-se o poder não em seus mecanismos gerais, mas em seus lineamentos, onde ele se torna capilar. O poder é visto como algo que circula funcionando em cadeia. Soberania e disciplina, legislação, direito da soberania e mecânicas disciplinares são duas peças absolutamente constitutivas dos mecanismos gerais de poder em nossa sociedade.
O estabelecimento do Exército como instituição deu-se paralelamente a emergência do Estado. A guerra antecedeu o nascimento dos Estados, o direito a paz, as leis nasceram no sangue e na lama das batalhas. A lei não nasce da natureza, mas sim de batalhas reais. A guerra é o motor das instituições e da ordem. O discurso da guerra perpétua talvez seja o primeiro discurso histórico-jurídico do Ocidente em contraste com o discurso filosófico-jurídico, no qual a verdade funciona como arma para vitória exclusivamente partidária. Nessa análise Foucault inverte a frase de Clausewitz “A guerra é a política por outros meios”. A guerra levou a regulação por meio da política. A política seria, então, a contribuição da guerra por outros meios.
A partir da teoria das raças constitui-se um discurso que levou a um combate que deve ser travado por uma raça considerada como sendo a verdadeira e a única, aquela que detém o poder e aquela que é titular da norma, contra aqueles que estão fora dessa norma. Aparece assim, um racismo de Estado, um racismo interno, o da purificação permanente como fundamento da normalização social. O poder é fundador e fiador da ordem, a história é o discurso pelo qual essas duas fundações que asseguram a ordem vão ser intencionadas e firam mais eficientes. O racismo nasce como tema da pureza da raça, toma o lugar de luta das raças. O racismo não é vinculado por acidente ao discurso e à política antirrevolucionária do Ocidente.
Foucault busca ver como apareceu, no Ocidente, certa análise do Estado, de suas instituições e de seus mecanismos de poder. A guerra começou a aparecer como analisador das relações de poder, no final do século XVI e no início do século XVII. Hobbes relaciona a guerra ao fundamento e princípios das relações de poder. Para Hobbes as guerras se manifestam em todas as direções, a guerra de todos contra todos. O Estado surge para evitar essa guerra de todos contra todos. A soberania se constitui a partir de uma forma radical de vontade que é vinculada ao medo. Mas o que Hobbes buscava eliminar era a conquista, não a guerra.
Nenhum comentário:
Postar um comentário